Com o objetivo de simplificar o entendimento sobre o tema, Tiago Martinelli, CTO da VERT, com o apoio de André Salem, CEO da Cryptum, escreveu um artigo que explica as principais diferenças entre as moedas digitais.
Se você tem acompanhado as notícias ou lido recentemente sobre investimentos e finanças, é provável que já tenha se deparado com termos como "Criptomoedas", "Stablecoins", "CBDC", "Blockchain", "DeFi", “Web3”, entre outros, que estão se tornando cada vez mais comuns no mercado. Estas tecnologias estão provocando discussões ao redor do mundo sobre como mudamos a maneira de pensar e lidar com o dinheiro. Contudo, apesar do interesse crescente, o tema pode ser complexo para quem está chegando agora. Esse texto é para você que deseja começar a entender melhor esses termos e suas conexões de maneira mais clara.
No Brasil, o anúncio do Banco Central sobre o lançamento do DREX, o real digital, aumentou ainda mais a necessidade de traduzir esses termos. Foi pensando nisso que resolvi escrever esse texto. Quero ajudar a esclarecer alguns conceitos relacionados aos tipos de moedas digitais, que servirão de base para entender o que está por vir.
Ao longo da leitura, se encontrar termos desconhecidos, não se preocupe e continue. Ao final, vou incluir alguns links adicionais para ajudar a esclarecer e expandir seu entendimento sobre o assunto.
Não entrarei na história de Satoshi Nakamoto, pois acredito que se você está com a dúvida enunciada no título desse texto, você já deve ter lido ou ouvido falar das criptomoedas mais conhecidas, como Bitcoin (BTC) e Ethereum (ETH). Caso não tenha familiaridade com esses temas, sugiro começar assisitindo a dois documentários de Torsten Hoffmann: “The End of Money As We Know” (2015) e “Cryptopia” (2020). É igualmente curioso e esclarecedor o paper que deu o nascimento ao Bitcoin: Bitcoin - a peer-to-peer eletronic cash system.
Dentro do escopo deste comparativo, quero focar em características específicas das criptomoedas que podem ajudar na compreensão conceitual de uso delas.
A definição de criptomoeda, em até 150 caracteres, é: “Uma moeda digital criptografada e sem controle centralizado”.
As criptomoedas tradicionais marcaram o início de uma revolução no uso das redes de blockchain para transações financeiras tradicionais, com um foco especial na descentralização do controle das moedas. Além disso, elas oferecem segurança por meio da criptografia, são acessíveis a qualquer pessoa com acesso à internet, permitem transações diretas entre usuários (peer-to-peer) sem a necessidade de intermediários e são totalmente digitais, não tendo equivalência com nenhum objeto físico.
O Bitcoin desbravou a primeira onda de adeptos desse novo modelo, até que em 2015, com a chegada do Ethereum, começamos ter a possibilidade de não só, transacionar criptomoedas em uma rede descentralizada, mas também de incorporar os chamados contratos inteligentes na blockchain para trazer programabilidade para a rede. Um exemplo básico seria definir condições específicas para a execução de transações na rede.
Outro marco importante no mundo das criptomoedas, foram os ICOs (Initial Coin Offerings) de novas moedas, inspirados pela mecânica dos IPOs (Initial Public Offerings) do mercado de ações. Através dos IOCs, muitos projetos de criptomoedas foram lançados a mercado, alguns com mais, outros com menos credibilidade. Mas, por que a credibilidade é tão importante? Porque o valor real atrelado a uma criptomoeda tradicional está diretamente relacionado a sua narrativa. Ela não tem lastro fiduciário algum com o mundo real. Isso resulta em uma volatilidade significativa, influenciada pelo nível de confiança que o mercado deposita nela. A seguir, apresento um gráfico exemplificando a volatilidade de uma criptomoeda:
No gráfico, observamos a evolução do preço do Ether (Ethereum), focando em dois momentos de grande valorização em 2018 e 2021.
Em 2018, o aumento foi impulsionado em grande parte pelos ICOs vinculados à rede Ethereum, e também pela popularização dos conceitos de contratos inteligentes e aplicações descentralizadas (dApps). Esse pico de valorização foi diminuindo e estabilizando-se antes de subir novamente em 2021, apoiado pelas tendências em Finanças descentralizadas (DeFi), Tokens não fungíveis (NFTs) e a atualização do Ethereum para a versão 2.0 que adota o mecanismo de consenso Proof of Stake.
Se você não entendeu algum termo nos parágrafos acima, eles não são nosso tema central aqui. O que é importante ressaltar é que os aumentos de valorização do Ethereum estão diretamente relacionados a eventos que promovem o uso do Ethereum como impulsionador de outras frentes que os adeptos acreditam ter potencial de sucesso no futuro utilizando redes blockchain. Isso é evidenciado pelo fato de que, após 2021, os preços não retornaram aos níveis anteriores de 2020, indicando que os acontecimentos de 2021, elevaram o grau de credibilidade e aceitação da rede. E esse cenário pode mudar completamente para o melhor ou pior a depender dos próximos acontecimentos futuros.
“No momento atual, inclusive, estamos próximos de uma das atualizações mais relevantes da rede Ethereum, conhecida como Dencun, que diminuirá as taxas de operação da rede em robusta magnitude; Além da aprovação iminente de seu ETF, vis-a-vis o que acontecera com Bitcoin.” - Andre Salem, CEO da Cryptum.
Fora isso, a volatilidade das criptomoedas também está ligada a liquidez distribuída em diversas exchanges (Mercado Bitcoin, Binance, Coinbase, entre outras), fazendo com que o impacto de preço em grandes ordens seja amplificado. A falta de conhecimento dos investidores, aliada a notícias especulativas também contribui para aumentar as variações de preço.
Uma stablecoin é uma criptomoeda? Sim, porém é sempre vinculada a um outro ativo. Um resumo em até 150 caracteres: “Criada para manter um valor mais previsível, muitas vezes lastreadas em moedas fiduciárias (como dólar, euro), commodities ou até em outras criptos”.
As stablecoins surgiram primariamente para diminuir a volatilidade no universo das criptomoedas. Um dos seus principais benefícios é facilitar a transferência de valores do mundo real para os ativos digitais, utilizando a tecnologia blockchain para realizar as transações, isso reduz significativamente a complexidade no processo de compra de um ativo digital. Por exemplo, entre as stablecoins mais conhecidas estão: Tether (USDT) lastreada no dólar americano; a USD Coin (USDC); e a Paxos Gold (PAXG), que é lastreada em ouro.
O processo de compra de dólar e ouro em stablecoin, é tão fácil quanto comprar qualquer criptoativo. No caso do dólar, por exemplo, consigo manter dólar em minha carteira de criptoativos sem a necessidade de mandar dinheiro para o exterior.
A importância e o crescimento deste novo mercado podem ser claramente observados ao analisarmos o volume de settlement em 2022.
Contudo, existem desafios associados, principalmente porque as stablecoins são emitidas por entidades privadas. Isso significa que uma empresa as emite e é responsável por garantir a sua liquidez e estoque, fazendo com que uma potencial má gestão ou representação incorreta dos ativos subjacentes a elas possa trazer altíssimo risco para quem as compra. Nos Estados Unidos, a regulamentação dessas criptomoedas tem sido amplamente debatida, principalmente devido à falta de confiança em relação aos grandes emissores.
Nos exemplos mencionados, o Tether é propriedade da Tether Holdings (gerida pela Bitfinex), a USD Coin pertence à Circle, enquanto a Paxos Gold é administrada pela Paxos Trust Company.
Para investidores em criptomoedas, as stablecoins representam uma forma de diversificar os investimentos em ativos com menor volatilidade.
Sob a perspectiva da liquidez deste mercado, estamos entrando em uma fase especial, em que o cunho institucional o torna cada vez mais crescente e estável. Se durante 2023 tivemos as maiores falências e traumas do mercado cripto (imagem detalhando abaixo), agora o volume das emissões de stablecoins reflete a entrada dos investidores institucionais, bem como do crescente varejo - como destaca a ilustração abaixo:
Embora o tema das stablecoins seja vasto e complexo, não abordaremos as stablecoins algorítmicas aqui, por exemplo. Este texto se concentra nos conceitos básicos; para informações mais detalhadas, confira os links fornecidos ao final.
As CBDCs são criptomoedas? Não, apesar de utilizar base tecnológica similar, elas são emitidas e reguladas por um banco central. Seriam então Stablecoins? Também não. As CBDCs são a própria moeda fiduciária do país enquanto as stablecoins são uma criptomoeda que surgiu com o objetivo de reduzir a volatilidade das criptomoedas atrelando elas a um ativo estável, elas são emitidas por entidades privadas com controle descentralizado.
Em até 150 caracteres a definição é: “As CBDCs são equivalentes as moedas fiduciárias tradicionais, emitidas e reguladas pelos bancos centrais do mundo”, como o DREX no Brasil.
E por que usar o DREX se já temos o PIX?
Essa é uma discussão comum, e vou usar o racional que ouvi do próprio Banco Central para resumir aqui. Embora ambos representem a transferência de um valor entre contas, o PIX é equivalente a uma transferência direta e o DREX é a transferência condicionada a alguma coisa.
Abstraindo a tecnologia de blockchain e os smart contracts, que são a base para fazer com que o DREX funcione e também utilizado nas criptomoedas, vamos para exemplos práticos e didáticos:
Caso de uso do PIX:
Você foi ao supermercado passar a compra do mês, passou no caixa e fez o PIX. Tudo certo!
Caso de uso do DREX:
Você foi comprar um carro usado, e está preocupado em fazer o pagamento e não receber a documentação do veículo. Aqui é onde o DREX entra em jogo para oferecer segurança. O pagamento só será efetuado quando o DUT (Documento Único de Transferência) do veículo for transferido para o seu nome, e essa transferência só acontecerá quando o pagamento for confirmado pela sua conta. É essa coordenação que o DREX possibilita.
Fonte: Exame
Além de facilitar transações para os usuários, as CBDCs também vêm carregadas de algumas promessas para melhorar o sistema financeiro global, como: aumento de eficiência nos meios de pagamento, redução de custos de transação, potencial de reduzir as fraudes no sistema financeiro, incluir regras à moeda corrente do país de forma rápida, aumentar a inclusão financeira para pessoas desbancarizadas. Em outubro de 2023, por exemplo, o Brasil realizou sua primeira transferência (em caráter de teste) para a China, usando CBDC, contribuindo para desdolarização das economias – em analogia à descentralização - e possibilitando a conversão de moedas instantânea entre países.
Os CBDCs apresentam preocupações e barreiras técnicas ainda em consolidação.
No Brasil questões de segurança e privacidade foram as principais razões que fizeram com que o Banco Central adiasse o lançamento do DREX, conforme detalhado aqui: https://exame.com/future-of-money/banco-central-adia-fim-testes-drex-maio-2024/. No ano passado também surgiram preocupações com a escalabilidade, como indicado neste link. Portanto, estamos diante de uma nova tecnologia e um novo paradigma sendo implementado que precisam de cautela pois essas tecnologias nunca foram aplicadas em uma escala tão ampla. Além disso, será necessário que as pessoas incorporem essas mudanças em seu dia a dia, tornando o esforço de conscientização tão crucial quanto o desenvolvimento tecnológico para essa transição.
Em países que não possuem um sistema de pagamento digital, como nos Estados Unidos, a aposta de uso da tecnologia blockchain e criação da CBDC também são vistas como maneiras de cobrir essa lacuna de eficiência, além dos outros benefícios.
A evolução das moedas digitais marca uma transformação sem precedentes no cenário financeiro global, alavancada por inovação tecnológica e pela crescente demanda por transações mais eficientes, seguras e inclusivas. Cada tipo de moeda digital oferece diferentes características e benefícios, adaptando-se a distintas necessidades e cenários.
Todas as três moedas mencionadas neste texto são baseadas na tecnologia blockchain, ou seja, todos os avanços tecnológicos que temos em blockchain podem ser aplicados a cada uma delas, assim como as suas fraquezas e incertezas.
Segue uma tabela comparativa para simplificar a compreensão:
As criptomoedas desafiam os modelos tradicionais de moeda e pagamento com sua estrutura distribuída, destacando a importância da segurança, da privacidade e da liberdade financeira. Por outro lado, as stablecoins surgiram como uma ponte entre o universo cripto e o tradicional, oferecendo reduzindo a volatilidade das criptomoedas, o que as torna uma opção atraente para reserva de valor. Por fim, as CBDCs representam um passo significativo dos governos e bancos centrais em direção à modernização do sistema financeiro, visando aprimorar a eficiência, aumentar a inclusão financeira e fortalecer a segurança das transações monetárias.
Apesar das diferenças, no Brasil, a rede selecionada para o CBDC permite uma integração direta com os contratos inteligentes e soluções desenvolvidos na blockchain da Ethereum, a segunda maior do mundo. Este tipo de fundamentação técnica tem sido compartilhada entre a maioria esmagadora das CBDCs, e significa que, apesar de representarem um contexto específico, em um horizonte de médio prazo, é previsto haver uma maior correlação no câmbio entre os CBDCs, Stablecoins, e propriamente as Criptomoedas tradicionais, convivendo em um ambiente de maior integração e menos obstáculos.
À medida que os bancos centrais do mundo exploram o potencial das CBDCs e estudam adaptar suas infraestruturas para acolher essa nova forma de dinheiro, é fundamental que as pessoas se mantenham informadas, acompanhem ou participem ativamente de debates sobre a implementação dessas tecnologias.
Fonte: Atlantic Council
Em última análise, o entendimento e a adoção dessas novas formas de moeda digital não apenas transformarão as transações financeiras, mas também poderão moldar a integração econômica global, desbloqueando novas oportunidades e fomentando um ambiente financeiro mais dinâmico para as gerações futuras.
Aproveito para agradecer ao André Salem, CEO da Cryptum, pela colaboração e apoio na produção deste artigo. Espero ter ajudado a todos, com esse primeiro contato conceitual com esses tipos de moeda digital.
Um pouco mais sobre ICOs (Initial Coin Offering) https://www.infomoney.com.br/guias/ico-initial-coin-offering/.
Volatilidade nas criptomoedas https://www.mercadobitcoin.com.br/economia-digital/criptomoedas/volatilidade-o-que-e-e-quais-as-vantagens-no-mercado-de-criptomoedas/
Stablecoins https://www.infomoney.com.br/guias/stablecoins/
Playlist do Banco Central sobre o DREX https://www.youtube.com/playlist?list=PLhqfgkxuHXh4BM4lpz2waKpuuQyrR_v4C
Status das CBDCs pelo mundo https://www.atlanticcouncil.org/
Antecipar recebíveis é uma prática financeira que muitas empresas utilizam para otimizar seu fluxo de caixa e garantir uma maior previsibilidade em suas operações.
Preparamos este conteúdo que explica o significado disso e também algumas perguntas frequentes, a fim de proporcionar mais segurança sobre o tema.
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